Vida de polícia... Alguém quer experimentar?
Saímos para cumprir um mandado. A tarde estava abafada e úmida. Chegamos ao casebre e um homem velho nos atendeu. No interior, numa cama de casal, duas mulheres que dormiam despertaram ao entrarmos. O ar naquele lugar era irrespirável. A distância entre as tábuas do chão permitia ver que logo abaixo havia um solo úmido, de onde exalava cheiro de esgoto.
As buscas iniciaram percorrendo os cantos do cubículo destinado à cozinha. Sobre o fogão havia panelas com restos de comida do almoço, fermentando com o calor e atraindo a presença de moscas. O velho tossia muito, assim como uma das mulheres, segundo ele, em razão de asma. Mais provável uma tuberculose, em vista da desnutrição. Nós, ali, respirando o mesmo ar viciado e saturado pelo mau cheiro.
O esgoto da casa corria para uma vala rasa, que transbordara durante as fortes chuvas que caíram na região. Por isso, o terreno ficara coberto por uma fina camada de excrementos fluidificados. Era difícil a revista do local; era nojento mexer em qualquer coisa lá. Em seguida chegaram três crianças, filhos de uma das mulheres. Um dos pequenos começou a chorar, assustado com a nossa presença.
A mãe mandou que sentassem em um degrau. Abaixei para conversar com eles, tentar acalmá-los. Deparei com três lindos pares de olhos verdes a me fitar, com a inocência peculiar das crianças, vivam onde viverem. Ali era a casa delas. Sobre o fogão, a comida em fermentação que comeriam. Aquela mãe que tossia era o único porto seguro que conheciam.
Estavam brincando na margem do rio, quando alguém avisou que fossem para casa; e para lá correram, sem entender o que acontecia. Passado o susto inicial, logo já estavam à vontade, apesar da nossa presença, encantados com a viatura. Receberam alguma atenção nossa e foram acalmando. Dava para perceber que aquelas crianças haviam tocado o coração de cada um de nós, embora não pudéssemos demonstrar abertamente.
Resolvemos ir embora, pois nada havia ali. Porta fria, mas o coração febril, apertado. Da viatura olhei novamente para as três e só pude pensar onde estava Deus.
Vida de polícia... Alguém quer experimentar?
Fonte: Canal Ciências Criminais
76 Comentários
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Bela narrativa, excelente o texto.
Cansados de ver notícias ruins, balas perdidas, policiais corruptos, invasões em comunidades carentes, policias despreparados, etc.
Esta é a imagem de nossa Polícia do Brasil.
Por que a venda dessa imagem?
Antigamente, a ditadura vendia uma imagem da polícia truculenta, soberana, a mídia por sua vez, pouco falava e quando o fazia, só por Deus.
Atualmente, com a democracia, podemos "escrachar" tudo e a todos, é o inverso da ditadura onde não poda se fazer nada.
Por que estou fazendo este comparativo?
Pelo fato que notícias ruins vendem mais que as boas (matéria já comentada aqui no Jus), e por sua vez, em relação ao texto, não seria diferente, pelas razões;
Uma por muitos jornalistas, editores, políticos, perseguidos na então ditadura, intrinsecamente, fazem uma "perseguição a esta classe, outra, que por sua vez, ela, também deixa a desejar. ( despreparo, falta de investimento do poder público, etc)
Juntando esses fatores, eis a imagem que presenciamos todos os dias pelas redes televisas.
Ao ler o texto, fui remetido a imagem boa da polícia, de uma corporação, (Polícia Militar e Civil) que a maioria dos seus agentes, são pessoas sensíveis, humanas, ótimos profissionais, mas não aparecem na mídia, é como se, fazer o bem é nossa obrigação, e divulgar também não o seria?
Reafirmo, notícias ruins vendem mais que as boas.
Respondendo as perguntas do texto, toda criança sonha em ser bombeiro, (pelo menos na minha infância), mas não querem ser policiais, ledo engano, pois para ser um bombeiro terá que ser um policial militar, assim como, para ser um delegado, terá que ser um policial civil.
Quanto a Deus, estava no olhar das crianças pedindo socorro pela miserabilidade em que vivem, e no olhar do policial que olhou para traz, viu e sentiu a necessidade, o clamor dos menos favorecidos. Deus estava no meio da situação.
Como? simples, os policiais entraram, revistaram, sensibilizaram, fizeram seu trabalho bem feito, diginos de bons policiais, infelizmente não saíram na mídia, só no Jusbrasil.
Mas estariam na primeira página se;"Policiais entram num barraco na favela, chegaram quebrando tudo, agredindo quem estivesse pela frente, até um velho doente acamado, e o pior, na presença das crianças indefesas que assistiam tudo caladas e amedrontadas com a invasão da polícia.
Alguém duvida?
Felicito os Policiais que trabalham com zelo e respeito a dignidade da pessoa humana. continuar lendo
Ótima explanação! Também merece uma publicação, não se atenha apenas aos comentários! Parabéns! continuar lendo
Valeu Paulo, você não deixou qualquer dúvida que ainda restasse da narrativa publicada!!!!!!!!!!!!!!!! continuar lendo
Paulo Abreu, excelente seu comentário.
O texto reflete todo pensamento de um policial. Usar a Lei estando ao lado do direito humano, em si e no outro.
O Estado é que "marginaliza" a imagem das Instituições Polícia Militar e Polícia Civil. O que assistimos e ouvimos falar das polícias são apenas as "consequências", pois as "causas" estão, repito, no Estado. Basta ouvir os clamores dos profissionais e verificaremos as suas necessidades. continuar lendo
Excelente texto,
Agora a respeito de Deus acho que já fez o suficiente, graças a sua misericórdia por ter entregado o seu único filho pra morrer por nos, assim eu e essas crianças poderemos um dia obter a vida eterna sem sofrimento. continuar lendo
Dra Silvia.
Se Deus existe não posso afirmar, tenho minha fé, é minha fortaleza. O que foram buscar não encontraram, ou porque não existia, ou não estava lá, e se estivesse, qual o desfecho?, não cabe a discussão.
Diante do exposto, penso em como a lei é confortável aos amigos e fria aos distantes, ainda assim é necessário que se cumpra, se não, haverá outra força que criará sua própria lei, e, aplicará, de forma implacável, imediata e irreversível, sem defesa, tribunal, e justiça, sendo um mesmo, Juiz, Defensor e Algoz.
Não é possível uma sociedade tolerar isto, e se dizer politizada.
Belo texto
Sds
Ingomar Goltz continuar lendo
Como assim esta descrição de miséria explícita???? Mas a nossa querida e amável Presidenta e seu fiel cumpanhero vulgo Molusco, não disseram a todos que a pobreza tinha acabado no Brasil e que agora o povo brasileiro exigia coisas mais elevadas...tipo "sinal do celular" pontualidade nos cumprimento dos horários dos aviões, comida nos supermercados com melhor qualidade, eletrodomésticos que gastem menos energia elétrica...etc.etc.etc.etc.etc. é uma pura vergonha este país...dá vontade chorar ao ler este relato acima! Coitado do Brasil! continuar lendo
É a história da realidade que vivemos neste país.
Quanto a Deus: não pode ser questionado. A culpa é nossa. De nossa falta de amor ao próximo, egoísmo, preconceito, etc.
Que bom seria se todo policial quando se deparasse com uma situação dessa se sensibilizasse e ajudasse, como foi o caso dos policiais de Santa maria/DF, que comovidos com a situação de um homem que havia sido preso por ter furtado um pedaço de carne num super mercado, que alem de pagarem a fiança também fizeram compras para o pobre homem.
Pesquise na internet: http://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2015/05/14/comovidos-policiais-pagam-fianca-de-ladraoefazem-compras-para-ele-no-df.htm
Deus é contigo. continuar lendo
tinha comida fermentando no fogão, não tinha? continuar lendo